Livraria 18 de Abril

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O cultivador

   

Havia um homem que cultivava a terra, a plantar um trigal. Vivia debruçado sobre a enxada, do amanhecer ao por do sol.

Então, juntava-se à família para gozar as delícias do aconchego familiar da esposa e dos filhos.

Não importava o tempo que fizesse. Sol, chuva, vento, frio ou calor. Lá estava o homem a amainar a terra, a libertá-la das ervas daninhas, a providenciar o adubo, colocar a semente na intimidade da cova, providenciar a água.

Aquela atividade contínua despertou o interesse de um viajante que por ali transitava com regularidade.

E, certo dia, o viajante se aproximou do cultivador e lhe perguntou:

Bom homem, vejo que estás velho e cansado. Por que não descansas dessa lida tão rude?

Sem se deter, o agricultor respondeu:

Não posso. Amo a terra. Amo meu trabalho. E por estar velho e cansado devo andar mais depressa. Tenho menos tempo a dispor e muito a fazer.

O viajante alongou a vista pelo imenso trigal, que balançava ao vento como mar de ouro líquido e comentou:

A terra recompensa o teu amor. O trigal está maravilhoso e será produtiva a colheita.

Mas não sou eu quem colhe, respondeu o agricultor. Eu apenas planto. Minha mulher e meus filhos é que fazem a colheita da generosidade do solo.

O viajante se despediu e seguiu o seu caminho. Necessitando empreender uma grande viagem, ausentou-se por vários meses.

Retornando, ao passar pela mesma estrada, encontrou o homem às voltas com a sua lavoura.

Era uma tarde fria, sem sol. A natureza toda parecia chorar, desanimada.

O viajante se aproximou do trabalhador incansável e observou que sulcos profundos lhe vincavam a face. Estava mais cansado, envelhecido e triste. Vestia-se de luto.

Perdeste algum ente querido? - perguntou.

O cultivador, com voz arrastada, respondeu:

Perdi, senhor. Toda minha família. em poucas semanas, um a um se foram, devorados por febre maligna. Fiquei sozinho.

O viajante se comoveu com tanta dor. Entretanto, por observá-lo ainda a trabalhar, sem descanso, na terra, ousou indagar:

Se toda tua família morreu, por que continuas nesta tarefa cansativa?

Já não tens mais quem colha os frutos. Semeias o trigo, mas nem tua mulher, nem teus filhos irão colher as espigas maduras.

Ah, senhor, respondeu o outro, parando por um instante seu trabalho. Isto não me preocupa. Prosseguirei plantando. Quem necessite, virá colher o trigo farto. E são tantos os que têm necessidades.

Surpreso pelo desprendimento do camponês, o viajante concluiu:

Tens razão, bom homem. Oxalá fossem muitos como tu, a plantar sem esperar a colheita.

A noite descerrou seu manto e tudo escureceu. Naquela noite, o agricultor se recolheu com a alma invadida por intensa saudade.

Recostou-se no leito e dormiu. Despertou, logo além, em um trigal pleno de luz, onde o aguardavam seus amores, felizes, de braços abertos, para juntos ficarem sem mais separação.

E todos eles guardavam o coração repleto de satisfação e alegria, por terem cumprido com seus deveres perante o próximo e perante Deus.

Redação do Momento Espírita, com base no cap. O cultivador, do livro À sombra do olmeiro, pelo Espírito que se designa Um jardineiro, psicografia de Dolores Bacelar, ed. Correio Fraterno do ABC.